“Os nomes acompanham as coisas” diz um conhecido provérbio latino. Como resultante do intercâmbio desigual entre as nações, verifica-se no Brasil e em outros países periféricos um crescimento extraordinário de estrangeirismos, empréstimos e neologismos no léxico. Paralelos à vinda das utilidades provenientes do chamado Primeiro Mundo, especialmente no campo da Informática, importam-se também sistemas filosóficos, teorias econômicas, modelos de análise, comportamentos e modismos os mais variados.
O fenômeno não é novo. Após a
independência política de Portugal, o Brasil, na ânsia de afirmar-se como
nação, buscou influências de outros povos e a França, que na época exibia
extraordinária fase de crescimento, foi escolhida como novo paradigma. Foi a
vez dos francesismos ou galicismos tão condenados pelos puristas. Muitas
palavras foram integradas à língua portuguesa (os empréstimos); outras
conservaram a forma original, talvez por conferirem um pouco mais de status a quem os empregava (estrangeirismos);
outras foram simplesmente criadas a partir de vocábulos já existentes e
aceitos pelo povo, porém com nova significação (neologismos).
A contribuição estrangeira sempre ocorreu
no vocabulário de todos os povos. O hebraico, por exemplo, exerceu forte
influência sobre o grego e este sobre o latim. O idioma do Lácio se impôs na
Península Ibérica e se misturou com os falares dos povos dominados, provocando
o surgimento das conhecidas línguas neolatinas.
No Brasil, o idioma do colonizador
extinguiu as línguas crioulas, mas não ficou de todo isento de sua influência,
como atestam as inúmeras palavras indígenas. O negro também conseguiu, com a
sua rica contribuição para a cultura brasileira, enriquecer
significativamente o vocabulário.
Modernamente, com a globalização, juntamente
com o importado, surge a necessidade de nomear urgentemente o novo produto. A
velocidade com que o fenômeno ocorre, a total impossibilidade de controle das
academias e entidades voltadas para o estudo do vernáculo, agravado com o seu
crônico distanciamento da realidade linguística do país conduzem ao surgimento
de vocábulos que muitas vezes lamentavelmente violentam grosseiramente a
estrutura da língua portuguesa. Exemplo mais antigo, veja-se o vocábulo gol, que no plural recebeu o s sem
a necessária presença da vogal temática e de kosovares,
tradução apressada e leviana do inglês, com a presença de um sufixo indicador
de adjetivo pátrio completamente estranho ao nosso sistema linguístico.
Há realidades novas que receberam
designação de palavras já existentes no idioma (carreata, mensalão) e outras
que surgem a partir de palavras estrangeiras (deletar, escanear). Nossa amiga
Lia Sanders manifestou na última contribuição para o Matutando o Brasil a necessidade de se criar no idioma
pátrio palavra correspondente ao Vorfreude,
do alemão, que teria mais ou menos o sentido de antegozo por algo bom que ainda vai
acontecer. A proposta é
pertinente. Lembrou-me Machado em Esaú
e Jacó - “há pessoas para
quem o adágio que diz que “o melhor da festa é esperar por ela” resume todo o
prazer da vida”. Parece não haver mesmo palavra em português que traduza com
fidelidade do vocábulo tão bem referido.
Seria ingenuidade condenar a presença de
estrangeiros, empréstimos e neologismos no idioma. São eles inevitáveis e
perfeitamente aceitáveis, quando necessários para denominar realidades
inteiramente novas. Nestes casos, servem até para enriquecer o léxico. Muitos
conferem um valor altamente expressivo, quando possuem constituição
sonora mais motivada do que o correspondente no vernáculo. A busca pela
expressividade levou o já citado Machado de Assis não só a utilizá-los, mas com
fina ironia a criticar a imposição de neologismos ridículos para substituir os
francesismos da época.
Existem, no entanto, atualmente na língua
portuguesa palavras e construções perfeitamente supérfluas, como os inúmeros
estrangeirismos do chamado economês, que revelam ora o exibicionismo ridículo
de quem os emprega, ora a subserviência crônica diante do que é estrangeiro,
ora a busca inescrupulosa de mistificar teorias para torná-las inacessíveis à
compreensão, diante da vacuidade e a inoperância de seus conteúdos e métodos.
Myrson Lima
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