sábado, 11 de março de 2017

Neoliberalismo: a negação da negação

A base ideológica da filosofia neoliberal consiste numa aforismo interessantíssimo, já destacado por pensadores do calibre de Slavoj Žižek e Zygmunt Bauman: é uma ideologia que se apresenta como não ideológica. Essa forma ideológica invade todos os espaços da vida comum, baseada (i) num discurso vazio de conteúdo, com frases de efeito e (ii) lideranças sem alternativas para o mundo como ele se apresenta. 

No que respeita ao primeiro item sob análise, é comum encontrarmos textos espalhados por pseudointelectuais que nos indicam, com uma profundidade teórica assustadora, que "a liberdade liberta", a nos convencer que somos livres, a despeito de todos os fatores que nos indicam que essa liberdade, num mundo de consumo, não é para todos. Em segundo lugar, as propostas de eliminação do Estado, das instituições burocráticas e da superestrutura que vigora no mundo ocidental (variando de acordo com a cultura de cada sociedade, como é óbvia), é necessária para pôr fim à burocracia que atravanca o progresso, aos custos que nos impedem de consumir mais, e à regulamentação que impede que o mercado avance em todos os aspectos da vida humana - mesmo que isso nos indique um paulatino processo de reificação (coisificação da condição humana).

Esse domínio ideológico encontra campo fértil em território brasileiro, basicamente por duas razões: falta de estrutura educacional, que tenha preparado a população para os debates que envolvem a política e a economia - como componentes de uma vida cidadã-, e a força de grandes grupos econômicos que têm interesse em desregulamentar diversas conquistas sociais já sedimentadas no ordenamento jurídico brasileiro (por via dos tratados internacionais que ensejaram o surgimento, por exemplo, dos direitos fundamentais individuais e coletivos na Constituição Federal de 1988).

Diante disso, a liderança politizada para um pensamento progressista fica restrita à classe média que, obviamente, luta para garantir a continuidade de seus direitos (ou privilégios, visto que eles não se estendem ou não são gozados com a mesma intensidade pela classe subalterna e miserável do País), que não costuma dialogar com os desprovidos. De fato, é preciso reconhecer que o clamor por justiça social e por bem-estar fica restrito às rodas de conversas universitárias e aos pequenos grupos de pressão organizados que, ocupando partidos políticos, sindicatos ou outras formas de grêmios sociais, como as Organizações Não-Governamentais, fazem seu papel de contra-posição ao atual modelo hegemônico que domina os meios de comunicação de massa.

Portanto, resta perceber que "a negação da negação" é nada mais do que uma afirmação: o pensamento neoliberal, que desregula a economia, os direitos sociais, a proteção do meio ambiente e tantas outras áreas do interesse coletivo, é um tipo discursivo individualista e ensimesmado, fechado para a discussão por uma ausência ou lacuna: não há uma contraponto que sirva de alternativa, de inovação ao "fim da História" decretado por Fukuyama. A grande ironia é que, como "negação da negação", ele reafirma tão-somente o velho conflito de interesses e a luta de classes, num modelo defasado que crê na expansão ilimitada dos recursos e na exploração da força de trabalho - enquanto houver meio ambiente social e natural. Enquanto houver...

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